20 setembro 2007

O LIVRO DIDÁTICO QUE A GLOBO QUER PROIBIR.

Reproduzo aqui, na íntegra ,a resposta da editora do autor Mario Shmidt. Torno a repetir que o meu propósito é de tão somente abrir espaço para a defesa do autor diante do massacre injusto sofrido por sua obra.
Caro Wallace,
Nós, da Editora Nova Geração, somos extremamente gratos a sua valiosa colaboração. É um belo texto, bem escrito e argumentado.
A partir do infame texto de Ali Kamel no Globo, diversas matérias começaram a pipocar nos mais diferentes meios de comunicação.
A grande maioria delas sequer procurou ler o livro do professor Mario Schmidt e começou a utilizar apenas os trechos sacanamente selecionados pelo editor global.
Abaixo reproduzimos algumas respostas que foram enviadas a alguns órgãos de imprensa.
Gostaríamos de aproveitar para pedir permissão para reproduzir sua carta enviada ao Globo como demonstração do apoio dos professores ao livro do professor Mario Schmidt.

Novamente agradecemos seu valoroso apoio,

Equipe Nova Geração


O LIVRO DIDÁTICO QUE A GLOBO QUER PROIBIR

A respeito do artigo do jornalista Ali Kamel no jornal O Globo de 18 de setembro de 2007 sobre o volume de 8ª série da obra Nova História Crítica, de Mario Schmidt, o autor e a Editora Nova Geração comentam:
Nova História Crítica da Editora Nova Geração não é o único nem o primeiro livro didático brasileiro que questiona a permanência de estruturas injustas e que enfoca os conflitos sociais em nossa história. Entretanto, é com orgulho que constatamos que nenhuma outra obra havia provocado reação tão direta e tão agressiva de uma das maiores empresas privadas de comunicação do país.
Compreendemos que o Senhor Ali Kamel, que ocupa cargo executivo de destaque nas Organizações Globo, possa ter restrições às posturas críticas de nossa obra. Compreendemos até que ele possa querer os livros didáticos que façam crer “que socialismo é mau e a solução para tudo é o capitalismo”. Certamente, nossas visões políticas diferem das visões do Sr. Ali Kamel e dos proprietários da empresa que o contratou. O que não aceitamos é que, em nome da defesa da liberdade individual, ele aparentemente sugira a abolição dessas liberdades.
Não publicamos livros para fazer crer nisso ou naquilo, mas para despertar nos estudantes a capacidade crítica de ver além das aparências e de levar em conta múltiplos aspectos da realidade. Nosso grande ideal não é o de Stálin ou de Mao-Tsé Tung, mas o de Kant: que os indivíduos possam pensar por conta própria, sem serem guiados por outros.
Assim, em primeiro lugar exigimos respeito. Nós jamais acusaríamos o Sr. Kamel de ser racista apenas porque tentou argumentar racionalmente contra o sistema de cotas nas universidades brasileiras. E por isso mesmo estranhamos que ele, no seu inegável direito de questionar obras didáticas que não façam elogios irrestritos à isenção do Jornal Nacional, tenha precisado editar passagens de modo a apresentar Nova História Crítica como ridículo manual de catecismo marxista. Selecionar trechos e isolá-los do contexto talvez fosse técnica de manipulação ultrapassada, restrita aos tempos das edições dos debates presidenciais na tevê. Mas o artigo do Sr. Ali Kamel parece reavivar esse procedimento. Ele escolheu os trechos que revelariam as supostas inclinações stalinistas ou maoístas do autor de Nova História Crítica. Por exemplo, omitiu partes como estas: “A URSS era uma ditadura. O Partido Comunista tomava todas as decisões importantes. As eleições eram apenas uma encenação (...). Quem criticasse o governo ia para a prisão. (...) Em vez da eficácia econômica havia mesmo era uma administração confusa e lenta. (...) Milhares e milhares de indivíduos foram enviados a campos de trabalho forçado na Sibéria, os terríveis Gulags. Muita gente foi torturada até a morte pelos guardas stalinistas...” (pp. 63-65)
Ali Kamel perguntou por onde seria possível as crianças saberem das insanidades da Revolução chinesa. Ora, bastaria ter encontrado trechos como estes: “O Grande Salto para a Frente tinha fracassado. O resultado foi uma terrível epidemia de fome que dizimou milhares de pessoas. (...) Mao (...) agiu de forma parecida com Stálin, perseguindo os opositores e utilizando recursos de propaganda para criar a imagem oficial de que era infalível.” (p. 191) “Ouvir uma fita com rock ocidental podia levar alguém a freqüentar um campo de reeducação política. (...) Nas universidades, as vagas eram reservadas para os que demonstravam maior desempenho nas lutas políticas. (...) Antigos dirigentes eram arrancados do poder e humilhados por multidões de adolescentes que consideravam o fato de a pessoa ter 60 ou 70 anos ser suficiente para ela não ter nada a acrescentar ao país...” (p. 247)
Os livros didáticos adquiridos pelo MEC são escolhidos apenas pelos professores das escolas públicas. Não há interferência alguma de funcionários do Ministério.
O sr. Ali Kamel tem o direito de não gostar de certos livros didáticos. Mas por que ele julga que sua capacidade de escolha deveria prevalecer sobre a de dezenas de milhares de professores? Seria ele mais capacitado para reconhecer obras didáticas de valor? E, se os milhares de professores que fazem a escolha, escolhem errado (conforme os critérios do sr. Ali Kamel), o que o MEC deveria fazer com esses professores? Demiti-los? Obrigá-los a adotar os livros preferidos pelas Organizações Globo? Internar os professores da rede pública em Gulags, campos de reeducação ideológica forçada para professores com simpatia pela esquerda política? Ou agir como em 1964?



ALI KAMEL, O ANTICAPITALISTA

Vamos inicialmente esclarecer alguns pontos importantíssimos em relação ao artigo de Ali Kamel.

1- Quem seleciona os livros didáticos não é o MEC. As coleções didáticas são selecionadas por diversas universidades conceituadas (notórios antros comunistas, é verdade).

2 - Quem escolhe os livros didáticos são os professores. Mais de 50 mil professores por todo Brasil analisaram as dezenas de coleções de história disponíveis e escolheram livremente a coleção Nova História Crítica como a melhor coleção.

3 - A coleção Nova História Crítica é um sucesso ainda maior no mercado particular, ou seja, nas escolas privadas, que sequer dependem do MEC para escolher seus livros.

Considerando estes três pontos, perguntamos: terão errado todos estes 50 mil professores? Saberá o senhor Ali Kamel escolher melhor que eles? O que devemos fazer com esses milhares de professores que preferem a obra do professor Mario Schmidt às demais? Demitimos? Reeducamos ideologicamente? Devem ir para o pau-de-arara, como nos bons tempos da ditadura e do CCC? E os livros que eles já escolheram? Queimamos os livros em praça pública? Enfim, como incita Ali Kamel, algo precisa ser feito. Organizemos já uma marcha com Deus pela Família, Tradição e Propriedade!

Pois não podemos mais aturar os 50 mil professores em todo o Brasil que consideram, entre dezenas de coleções disponíveis, a Nova História Crítica do professor Mario Schmidt a melhor de todas, tornando a coleção o maior fenômeno editorial didático de todos os tempos.

Porque este, sim, é o maior crime da coleção Nova História Crítica: ser um grande sucesso dentro do mercado capitalista! (Olhe aí as terríveis táticas gramscianas em ação!).

Para quem não conhece, é interessante saber que no mercado de livros didáticos existe uma concorrência absolutamente livre e legítima entre as editoras. Quem escolhe os livros para as crianças é a pessoa mais capacitada para isso: o professor. Nesse segmento, o livre mercado vem funcionando a pleno vapor; uma editora tentando fazer um livro melhor do que a outra. Quem tem o melhor livro leva a maior fatia do bolo.

Porém, o senhor Ali Kamel, como todo bom porta-voz do capitalismo real, odeia que o livre mercado funcione como um livre mercado. O senhor Ali Kamel acha que o Estado deve intervir fortemente nessa área. O governo deve censurar livros de determinado matiz ideológico e impedir que os professores escolham livremente seu material didático para nossas crianças. (Ah, as nossas crianças! Para Ali Kamel, molecada assistindo a cenas de sexo na novela, tudo bem. Mas livro de esquerda escolhido livremente pelo professor não pode.)

O professor Mario Schmidt é notoriamente um severo crítico do capitalismo. Para Ali Kamel, olavetes, reinaldetes e "nova direita", isso, atualmente, é um pecado mortal - onde já se viu? Um sistema tão bonitinho, tão limpinho e responsável, como é possível que não se admita que o capitalismo é o sistema econômico perfeito, para não dizer o sistema econômico terminal da humanidade. Quem ousaria levantar críticas ao capitalismo e - horror, horror! - encontrar qualidades no socialismo?

Mas é muito estranho que justamente onde o sistema capitalista deveria atuar de maneira exemplar, ou seja, na livre concorrência, na igualdade de oportunidades no mercado, onde o melhor produto vence, o senhor Ali Kamnel murche em seu fervor capitalista.

No mercado de livros didáticos, a opinião do mais abalizado consumidor - o professor - não deve ser respeitada e o Estado deve intervir diretamente para eliminar o campeão da livre concorrência, se a ideologia deste não se coaduna com a das Organizações Globo. É nisto que acredita o senhor Ali Kamel, o verdadeiro o anticapitalista.

PS - É curioso que o maior veículo de ideologia do Brasil, a Rede Globo, venha reclamar da edição ideológica do material histórico. Ali Kamel cita vários trechos do NHC no seu artigo. O exíguo espaço certamente o impediu de citar, entre outras, a página 319 do referido livro, que conta a história da edição do debate LULA X COLLOR feita pela Globo no Jornal Nacional. O que será que Ali Kamel achou deste trecho? O que ele acha que o Estado deveria fazer com uma emissora que "trabalha a cabeça das pessoas" desta forma? A mesma coisa que ele sugere que faça com livros didáticos?