27 fevereiro 2013

Tire seu cinismo do caminho.Por uma nova "estética da existência".



Muito se discute sobre a falta de ética.Não há falta de ética,o que há é uma ética que fundamenta os caminhos e normas sociais em que vivemos.Melhor dizer que sobrevivemos à ética atual,a ética é um conjunto de  princípios universais.Um problema moral é quando um desejo pessoal se contrapõe aos princípios éticos.O edifício teórico ético nos assombra quando queremos desestabilizar este modelo instituído.Mas a minha ação moral ou contra-moral,é afirmação dos valores aceitos ou pode significar a transgressão da moral vigente.

A ética que prevalece em nossos tempos é a ética construída historicamente pelos sistemas filosóficos que acompanharam as transformações burguesas ao longo da história.Vivemos a ética burguesa.E nos alarmamos,quando somos críticos a este modelo de civilização que está posto.Um modelo do Capital,que cria signos que não correspondem ao humanismo,a valorização da vida com toda a dignidade.

Foucault,ao estudar Epicuro definiu ética como a “estética da existência”.O modo como o indivíduo vê beleza em sua vida, a maneira e os caminhos  com que deseja construir sua existência.E este modelo pode ser moral,aceitável enquanto padrão de comportamento ou não.Eis a encruzilhada da humanidade.Ratificamos os comportamentos da ética do Capital,a mesquinha ética do capitalismo,competitiva antes de solidária,individualista antes de reconhecer o outro como parte da construção de si mesmo(Alteridade).

A moral vigente é estabelecida pela ética do consumo e do lucro,somos modelados pela manufatura do sucesso,que nos permite Status,fator de diferenciação dos outros,não “tão bons quanto nós”.E aceitamos tudo isso.

Em “Romeu e Julieta” de Shakespeare nos contorcemos de dor, quando do final infeliz do casal que se ama se concretiza. Esta história coloca a regra social em xeque ,o valor moral expresso na paixão vai de encontro a ética estabelecida.Precisamos entender o recado do autor.O que está estabelecido não necessariamente nos servirá para eternidade.A paixão,em dose controlada,pode significar um novo estado de coisas,uma nova ordem,uma nova ética.

Os gregos construíam  a imagem do confronto das paixões,os desejos, com a ética,como um barquinho em meio à tempestade em alto mar,sem rumo,sem direção,pronto a afundar.É assim que nos vemos quando estamos apaixonados,no sentido largo da palavra,quando desejamos algo,alguma coisa ou alguém.O caminho da correção dos sentidos ou dos sentimentos estaria em racionalizar esta tempestade,adaptar ou sucumbir meu desejo às normas éticas universais estabelecidas como padrões de correção.Este é o princípio da ordem,que pode ser “benéfico”,calmante filosófico,na medida em que nos vemos de novo adaptados às rotinas morais.Será esta a solução?

É aí que entra a relativização do Universal.O Universal que a humanidade consagra em um esforço histórico,”sagrados” valores, podem em certa medida serem desconstruídos.A crítica à moral vigente é uma necessidade para o desenvolvimento ético da humanidade.Ela sim,pode significar descontrole,pode significar ausência de ordem,mas será mesmo que a ordem estabelecida,os valores burgueses sacralizados pelo Iluminismo,será que eles ainda nos servem?Alguns dizem que ainda não alcançamos a utopia iluminista.Outros,que elas são a atualidade ética em que vivemos.Não precisamos de psicanálise,não há crise no indivíduo,a crise é filosófica,a crise é do modelo de valores petrificados pelo sistema capitalista,seu liberalismo político e sua cultura de massa.O estresse social deve implodir os rumos atuais,construindo um novo modelo,uma nova ética.O descontrole também pode ser interpretado como liberdade.

Só a transgressão da ética atual pode resignificar a humanidade.A crítica da moral é um papel filosófico que deve ser assumido por cada indivíduo,que conseguirá com a força da sua razão,iluminar espaços que são obscurecidos pela cultura capitalista,superar o Simulacro de realidade que nos foi imposto,promover a autonomia do pensar,desamarrar os grilhões que falsificam a realidade.

Somente a subversão de valores éticos pode permitir uma ética universal que seja Transcendência,superando a Imanência material,o que nos prende a falta de lucidez,o que nos torna uma humanidade angustiada,que sofre quando enxerga as  mazelas produzidas pelo sistema da exclusão.A culpa é a sombra que nos acompanha mas a ignoramos como fazemos como as  sombras de nossos corpos.Mas esta angústia coletiva é logo superada pelas “falsas crenças da realidade”,como dizia o filósofo Epicuro.A ilusão é a constituição da nossa vida atual.É o psicótico desejo de fugir de uma vida que pesa aos ombros ,que pesa na alma,mas banalizamos e naturalizamos esse modelo de existência irreal,incompatível com o modelo ético que almejamos,incompatível com os valores de justiça que gostaríamos de alcançar.

Só a subversão nos salvará da ética que condena a vida de bilhões.Condenados à fome,uma fome de nova ética que venha substituir o sistema,este padrão ético que faz parecer que o erro é individual,quando na verdade é o modelo universal de existência que condena a cada um na medida em que consagra seus falsos sonhos,ilusões descabidas que nos tornam doentes moralmente,decadentes mesmo que economicamente  felizes,mesmo que tenhamos alcançado os píncaros do alpinismo social.

A nova “estética da existência”,a nova ética,os novos princípios de uma nova humanidade que sufocará  a crise civilizatória em que vivemos,certamente não passa pelo modelo filosófico do capitalismo.Uma nova ética que supere a abominação que nos tornamos,ao ignorar a hipocrisia social que fazemos de conta não existir neste modelo global carcomido,com o rumo apontado para o abismo ético.Estamos no precipício,frente as escolhas que podemos fazer,por uma nova ética,ou continuemos a viver com a morte do sentido existencial.