24 julho 2008

Eduardo Galeano:poeta dos excluídos.




Estava com uma vontade enorme de escrever sobre acontecimentos das últimas semanas. A violência policial é um tema que me provoca angústias há pelo menos 15 anos. Violência praticada primeiramente aos deserdados e excluídos da terra de São Sebastião e agora, com maior efeito midiático, sobre a classe média.

Mas a aspereza do tema me fará adiar a revolver sobre tal angústia social.

Pensei então naqueles autores que "me fizeram" enquanto ser humano durante a minha vida, principalmente sobre aqueles que denunciam ou denunciavam quando estavam por aqui, as mazelas sociais criadas ou multiplicadas pelo sistema capitalista e suas variações contemporâneas .

E navegando pela internet, entediado com a agenda única dos grandes meios de comunicação, fui parar em uma página que anunciava o novo livro de Eduardo Galeano.

Este senhor-autor ou autor-senhor, que vê a vida dos habitantes destas américas com a mesma angústia de muitos que não conseguem esquecer das dores de uma América latina sangrada pela dominação física,econômica e cultural do imperialismo europeu e estadunidense.

Mas nunca a denúncia dos seus livros se deixou levar por mero ato temporal e localizado, no entanto, sempre embasado estruturalmente e historicamente, Galeano nunca perdeu em seus escritos a atitude poética , fazendo de suas prosas, obras de arte esteticamente inspiradoras do sublime espírito humano, liberto do materialismo e das perspectivas depresssivas que apontam o neoliberalismo e a globalização para o futuro da América Latina .

Este autor profundamente ético com estes bilhões de excluídos da festa do Capital é também extremamente estético através da beleza das suas linhas. Com admiração, exponho aqui um trecho do"Espejos. Una historia casi universal" onde fala em crônica poética sobre arte, desgualdade, feminismo, mídia, impérios e resitências.


Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos nos lembram.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, eles se vão?

Este livro foi escrito para que não partam.
Nestas páginas unem-se o passado e o presente.
Renascem os mortos, os anônimos têm nome:
os homens que ergueram os palácios e os templos de seus amos;
as mulheres, ignoradas por aqueles que ignoram o que temem;
o sul e o oriente do mundo, desprezados por aqueles que
desprezam o que ignoram;
os muitos mundos que o mundo contém e esconde;
os pensadores e os que sentem;
os curiosos, condenados por perguntar, e os rebeldes e
os perdedores e os lindos loucos que foram e são o
sal da terra.